ENTREVISTA
Considerado referência no segmento da cerâmica artística, Mestre Kenjiro Ikoma concedeu entrevista à GAC [Galeria de Arte Cerâmica] como porta-voz do projeto Cerâmica Contemporânea Brasileira. CURTA nossa página no facebook - link:
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GALERIA DE ARTE CERÂMICA - Como o sr. avalia a produção da cerâmica artística na atualidade -- e
qual o critério de avaliação do Cerâmica Contemporânea Brasileira [CCBRras] --
http://ceramicacontemporaneabrasileira.blogspot.com.br/ -- na publicação dos trabalhos enviados pelos
ceramistas?
MESTRE KENJIRO IKOMA - O CCBRas não avalia, mas se nutre da
diversidade, permitindo que ceramistas profissionais ou amadores, tenham
oportunidade de mostrar o seu trabalho, ampliando os espaços na cerâmica, seja
ela escultórica, utilitária ou decorativa. Olhamos para a realidade. Nosso
objetivo é fazer conhecer e tornar acessível o contato com estes ceramistas que
estão ativamente produzindo no Brasil. A única exigência é que os artistas
lidem com todo o processo cerâmico: modelagem, esmaltação e queima (seja em
atelier próprio ou atelier-escola)
GAC - Desde sua fundação, o CCBRas tem conseguido atingir
a meta à qual se propôs? Qual o retorno que têm alcançado com a iniciativa?
MESTRE KENJIRO IKOMA - Sim. Gradativamente, o CCBRas vem alcançando
seus intentos. O CCBRas nasceu da necessidade de conhecermos melhor a produção
cerâmica em nosso país: quem são, onde estão e quais são as linhas de trabalho
destes profissionais. Hoje, nosso painel acolhe quase 300 ceramistas. Sabia que
somos tantos? E ainda somos muitos mais... Há adesões diárias de todos os
locais do Brasil. Esta evolução crescente colabora com o aumento do
conhecimento e difusão da cerâmica e indica que estamos no caminho certo. Ao
percebermos que somos muitos e estamos em todos os lugares deste país, a troca
de informação e de contatos nos amplia e fortalece. Hoje, se você precisa fazer
contato com um ceramista do Ceará, por exemplo, você pode ir ao nosso painel e
encontrá-lo facilmente. Ou, se quer fazer aulas em Minas Gerais e não
sabe onde estão os ateliês, pode procurar no CCBRas e lá terá opções. A equipe
do CCBRas, é importante citar, é composta por um grupo de ceramistas
voluntários que doam seu tempo e, por que não dizer, disponibilizam seus
contatos, para somar esforços e realizar ações em prol do coletivo, ações que
confiram visibilidade e oportunidade aos ceramistas. Foi o caso de nossa primeira exposição
"Ikoma e alunos"; cito também a “Mostra Versatilidade e Arte -
Tigelas Brasileiras”. E, agora, nos preparamos para mais uma realização, que é
o evento "Vai um cafezinho?" Muito ainda precisa ser feito, nossos
passos são calmos, mas sabemos os caminhos que queremos trilhar.
GAC - Quem são, na sua opinião, os artistas considerados
referência no cenário artístico brasileiro e qual o diferencial que os destaca?
MESTRE KENJIRO IKOMA - Francisco Brennand, com sua forte influencia
mitológica, produz sua arte mergulhando no mistério da origem da vida e todos
os elementos associados a esta temática: o nascimento, o ovo, figuras de corpos
e de seus fragmentos, a figura da mulher – geradora da vida -; sem dúvida, é um
dos ceramistas brasileiros de maior destaque no cenário nacional e
internacional. Lygia Reinach, uma grande
artista, com suas obras instaladas no Parque da Luz, no Conjunto Nacional,
prédio ícone da Avenida Paulista, e na sede do Banco Itaú, entre outros locais.
Em suas esculturas, em geral de grandes dimensões, o barro dialoga com o espaço
arquitetônico da cidade. São muitos os destaque e talentos hoje no cenário da
cerâmica brasileira... Alberto Cidraes, Sara Carone, Norma Grinberg, Gilberto
Jardineiro... E não poderia deixar de citar a ampla influência dos ceramistas
japoneses, nomes de peso, como Shoko Suzuki, Akinori Nakatane, Shugo Izumi,
Kimi Nii, Mieko Ukeseki, Hideko Honma, nomes que contribuem com conhecimento e
ampliam o cenário da cerâmica brasileira. Grandes nomes de nossa forte tradição
na cerâmica denominada arte popular, como Adalton Fernandes Lopes, Manoel
Galdino, Mestre Vitalino, Noêmia Barbosa da Silva, Ulisses Pereira Chaves, Dona
Isabel Mendes da Cunha, Ana das Carrancas (Ana Leopoldina Santos)... Poderia,
ainda, citar Carlos Sivini, Antonio Poteiro (Antonio Batista de Souza), Thiago
Amorim, Manoel Borges da Silva (Mestre Nuca, que nos deixou recentemente).
Mencionando, ainda, os santeiros, as paneleiras... Cerâmica com alta dose de
brasilidade. Corro o risco de ser injusto e desculpo-me, pois certamente deixo
escapar nomes aqui. São tantos os ceramistas que expressam sua potente
criatividade, que apresentam surpreendentes soluções técnicas, realizam
associações significativas com o design e demonstram grande domínio cerâmico em
todas partes deste grande país, que seria impossível citar todos.
GAC - Existe uma linha tênue que separa a arte do artesanato, no contexto da
cerâmica? Como podemos avaliar o valor artístico de uma peça cerâmica, seja
utilitária, decorativa, artística, escultórica ...
MESTRE KENJIRO IKOMA - Na arte cerâmica existe uma busca
pelo estilo, pelo que é peculiar e próprio do universo de cada ceramista, além
disso, a cerâmica exige perfeito conhecimento dos materiais e seus processos
para se alcançar os objetivos e uma expressividade relevante. A arte cerâmica é
um constante desafio. Os trabalhos dos ceramistas diferenciam-se de acordo com
o olhar do mesmo sobre o mundo, como cada um define o caráter de sua obra, o
único, que leva à excepcionalidade do que se cria. Na tradição cerâmica, sempre
existiu a figura do Mestre, aquele com quem se passa por um processo de
aprendizagem. Isso pode remeter ao fazer artesanal, que também é um gênero de
arte. Mas, para estas questões, o mercado de arte hoje conta com os críticos,
os curadores e o mais antigo avaliador do que é ou não arte: o tempo. As
pessoas comuns avaliam quando decidem, ou não, levar uma peça cerâmica para sua
casa ou para sua coleção. O CCBRas, até o momento, objetiva divulgar o
interesse pela cerâmica e sua produção, em toda sua pluralidade, a um maior
número de pessoas. Fazê-las conhecer seus processos, possibilidades de expressão
e criação e, com isso, tornar a cerâmica mais familiar, habitual e inserida em
nossa cultura. Entender é um passo no sentido de aproximar e desejar.
GAC - Como o sr. vê a relação do
consumidor final e o artista? O que diferencia um trabalho de outro, para que
seja aplicado um valor à peça e a mesma seja valorizada por quem compra -- é o
olhar do comprador, que sabe identificar um trabalho de arte e valorizá-lo? ...
Ou essa relação depende da postura do artista, que sabe dar valor ao que produz
[ou não]?
MESTRE KENJIRO IKOMA - A cerâmica é uma arte que cresce no
conhecimento. Evolui conjuntamente como a história já comprovou. E neste tipo
de relação não é diferente. Povos em estágio de evolução tecnológica mais
avançada produzem arte cerâmica mais elaborada. Existem dois caminhos para o
artista ceramista. A produção centrada em uma obra individual ou a produção de
uma obra em série. Eu
optei pelo primeiro, até por falta de habilidades comerciais e maior
necessidade de expressão. O reconhecimento vem com o caminho visto em
perspectiva, o amadurecimento de um conjunto de obras que traduzem um todo
significativo, ou ainda, através de participações em exposições e obtenção de
prêmios. E o CCBRas é uma ferramenta que coloca na vitrine para os consumidores
todas estas possibilidade de ceramistas e intenta realizar cada vez mais ações
que nos levem gradualmente a evoluir na arte cerâmica.
GAC - Qual é o status atual da cerâmica artística brasileira sob o olhar do
mundo?
MESTRE KENJIRO IKOMA - Devido ao nosso curto período
histórico, a cerâmica no Brasil ainda não chega a ter a projeção merecida no
cenário internacional. Por outro lado, várias influências favoreceram certa
curiosidade e estimularam importantes diálogos com centros de produção cerâmica
no exterior. Nós processamos essas informações e criamos nossas peculiaridades,
mas ainda não conquistamos nossa parcela de reconhecimento internacional
merecido. Há um longo caminho para ser percorrido, que passa por um maior
número de centros de formação acadêmica, fortalecimento da indústria cerâmica,
acesso ao conhecimento gerado por essa indústria, a criação de hábitos do uso
da cerâmica em nossa cultura de forma mais destacada e também precisamos de
incentivos, eventos e premiações que elevem nossos artistas aos salões e
mostras internacionais.
Cerâmica
Contemporânea Brasileira [CCBRras]
http://ceramicacontemporaneabrasileira.blogspot.com.br
E-mail: ccbras@gmail.com